Roger Olson sobre arminianismo e calvinismo



Trecho retirado de Teologia Arminiana: Mitos e Realidades, de Roger Olson.

Ainda que a exegese bíblica sozinha não possa provar o calvinismo [monergismo] e nem o arminianismo [sinergismo], a exegese biblicamente correta reforça cada sistema de teologia. A Escritura é o material que fornece o padrão (gestalt) que forma a perspectiva (blik) que controla a interpretação de passagens individuais. Isto explica porque as pessoas são calvinistas ou arminianas quando falta uma prova exegética clara e inequívoca para cada sistema. Ambos Os sistemas veem Deus como identificado por toda a Escritura (visão sintética) de certa maneira.

Outra questão que complica a escolha entre o calvinismo e o arminianismo é que ambos os sistemas contêm problemas muito difíceis, se não insuperáveis. Os dois se esforçam muito para explicar grandes porções da Escritura; os dois precisam admitir mistérios que beiram as contradições dentro de seus sistemas. Edwin Palmer expressou mais fortemente do que a maioria dos calvinistas um problema em seu sistema de crença. Deus, ele admitiu, preordena tudo e, portanto, preordena até mesmo o pecado e o mal, no entanto, os humanos unicamente são culpados por fazer aquilo que não podem evitar. "Ele [o calvinista] percebe que o que ele advoga é ridículo... O calvinista livremente admite que sua posição seja ilógica, ridícula, insensata e tola." E, todavia, como a maioria dos calvinistas, Palmer alegou que "esta questão secreta pertence ao Senhor nosso Deus e que devemos deixar as coisas como estão. Não devemos investigar o conselho secreto de Deus".

Muitos calvinistas sentir-se-iam constrangidos com a admissão de Palmer acerca do mistério incorporado à crença calvinista. Ela é um pouco extrema, principalmente para os calvinistas que se importam com a lógica. Mas quase todos os calvinistas concordam que há pontos, tais como este, onde o calvinismo se depara com o mistério e que não pode dar uma solução racionalmente satisfatória. Os arminianos circunspectos, similarmente, reconhecem as dificuldades de lógica e problemas dentro de seu próprio sistema de crença. Quem pode explicar como a livre agência é a habilidade de fazer diferentemente do que alguém, de fato, faz? O livre-arbítrio não é um problema no calvinismo, pois ou ele é negado ou é explicado de tal maneira que é exaurido de todo o seu mistério. Mas todos os arminianos clássicos acreditam em um livre-arbítrio libertário, que é uma escolha autodeterminante; ele é incompatível com a determinação de qualquer tipo. Isto parece equivaler a uma crença em um efeito sem causa - a livre escolha da pessoa de ser ou fazer algo sem antecedente. Buridan, um filósofo cínico medieval, debochou de tal livre-arbítrio, sugerindo que uma mula que o possuísse iria morrer de fome ainda que duas bacias cheias de comida fossem colocadas na frente dela, pois nada a inclinaria a comer de uma bacia ou da outra! Os arminianos não são persuadidos por tais argumentos, eles sabem que a mula faminta escolheria livremente comer de uma bacia ou de outra. Mas deixando os sofismas de lado, os arminianos sabem que sua crença na liberdade libertária é um mistério (não uma contradição).

A questão aqui é que ambos os lados (e talvez todos os sistemas teológicos importantes) envolvem mistério, e ao tornar seus sistemas teológicos perfeitamente inteligíveis, o mistério é um problema. Ironicamente, ambos os lados tendem a apontar a fraqueza do outro ao apelar para o mistério sem admitir seu próprio mistério. Cada lado aponta para o pequeno cisco no olho do outro ao passo que ignora o cisco do mesmo tamanho (trave?) no seu olho! Assim, parece que as pessoas não são calvinistas ou arminianas porque um lado conseguiu provar estar correto, mas porque estas pessoas acham um conjunto de mistérios (ou problemas) mais fácil de se viver do que com o outro. Claro, os partidários de ambos os grupos apontam para passagens bíblicas de suporte e experiências (tal como ser tomado por Deus à parte de uma consciência de escolha). Mas, no final, nenhum lado pode completamente derrotar o outro ou conclusivamente provar seu próprio sistema. O filósofo Jerry Walls magistralmente enfatiza isso:
Notem que tanto os calvinistas quanto os teólogos do livre-arbítrio [Arminianos] chegam, por fim, a um ponto onde explicações adicionais são impossíveis. Ambos chegam ao limite da escolha inexplicável. O teólogo do livre-arbítrio não pode explicar plenamente porque alguns escolhem Cristo ao passo que outros não. O calvinista não consegue nos dizer por que ou sobre qual base Deus escolhe alguns para a salvação e ignora outros.
Ambos, então, enfrentam dificuldades insuperáveis ao explicar certas características de seus sistemas e devem admitir isso. Contudo, os dois sistemas permanecem dentro da cristandade protestante com igual sinceridade em relação à Escritura, igual bravura exegética, igual apelo histórico e igual comprometimento à ortodoxia cristã fundamental.

Então, qual é a solução? Por que ser um calvinista ou um arminiano? No fundo alguns cristãos são calvinistas porque quando leem a Bíblia (e talvez examinem sua própria experiência) eles veem Deus como todo-poderoso, supremamente glorioso, absolutamente soberano e como a realidade totalmente determinante. Isto é o "blik” deles, a visão sintética que guia a hermenêutica de passagens individuais. O grande teólogo puritano Jonathan Edwards era obcecado com esta visão de Deus, e ela guiava toda a sua teologia. Outros cristãos são arminianos porque quando leem a Bíblia (e talvez examinem sua própria experiência) eles veem Deus como supremamente bom, amável, misericordioso, compassível e o Pai benevolente de toda a criação, que deseja o melhor para todos. Esta visão de Deus guiou a teologia do grande avivalista João Wesley, que foi contemporâneo de Edwards. Claro, ambos os lados reconhecem algumas verdades na perspectiva do outro; os calvinistas reconhecem Deus como amável e misericordioso (principalmente em relação aos eleitos), e os arminianos reconhecem Deus como todo-poderoso e soberano. Ambos acreditam que Deus é supremamente grande e bom. Mas um lado começa com a grandeza de Deus e condiciona a bondade de Deus à luz da grandeza; o outro lado começa com a bondade de Deus e condiciona a grandeza de Deus à luz da bondade. Cada lado tem o seu "blik", que determina largamente como interpretam a Escritura. O teólogo arminiano Fritz Guy expressa o "blik" determinante arminiano sem rodeios: "No caráter de Deus o amor é mais fundamental que o controle". Esta perspectiva básica acerca de Deus é ecoada em toda a literatura arminiana. Ao escrever sobre a crença calvinista na reprovação incondicional (que Deus ignora alguns e escolhe outros para a salvação incondicionalmente), João Wesley foi extremamente honesto: "O que quer que a Escritura prove, ela jamais pode provar isso". Perceba que Wesley não disse isso por estar encantado por alguma norma extrabíblica que tem mais importância que a própria Bíblia. Antes, ele era guiado por uma visão imposta pela própria Escritura que impossibilita certas interpretações do texto.